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Precisa adiar ou cancelar a viagem por causa da pandemia? Conheça os seus direitos

A pandemia de covid-19 forçou a mudança de inúmeras viagens que já estavam marcadas e pagas. Por um lado, os próprios turistas desistiram dos passeios, por causa do medo de contrair o coronavírus na viagem ou então em razão de restrições impostas no espaço público, como o fechamento de lojas, restaurantes e pontos turísticos e até a proibição da circulação de pessoas. Por outro lado, as companhias aéreas, diante dos aviões esvaziados, se viram forçadas a cancelar diversos voos.

Diante dessa situação anormal, oficialmente reconhecida no Brasil em março de 2020, o governo federal baixou e o Congresso Nacional avalizou uma série de regras que disciplinaram os cancelamentos, os adiamentos e os reembolsos no setor de turismo enquanto a pandemia persistir.

Quando uma viagem é cancelada, por exemplo, a companhia aérea tem até 12 meses para reembolsar o dinheiro da passagem, com correção monetária. Como alternativa, o valor pode ser devolvido na forma de créditos para uso imediato na mesma empresa. Veja, a seguir, as principais regras em vigor, válidas tanto para empresas de turismo nacionais quanto para empresas estrangeiras que atuam no Brasil:

O que as regras listadas acima, específicas para o período da pandemia, fizeram foi momentaneamente flexibilizar as normas de defesa do consumidor. Em tempos normais, o reembolso por passagem aérea cancelada precisaria ser feito em até sete dias — e não em até 12 meses, como agora. No caso do cancelamento de hospedagem, o hotel seria obrigado a fazer o reembolso ao cliente. Neste momento, ele perde esse direito caso o hotel lhe ofereça créditos ou remarcação de data.

A consultora legislativa do Senado Beatriz Simas Silva, autora de um estudo sobre as repercussões da pandemia nas relações de consumo, explica:

— O Código de Defesa do Consumidor não previu regras para uma situação tão excepcional quanto a atual, de cancelamento em massa de serviços. É verdade que as novas leis desestimulam o reembolso em dinheiro, o que representa a supressão de uma garantia do consumidor, mas tais regras têm caráter temporário e buscam garantir a sobrevivência das empresas. Se fossem obrigadas a reembolsar imediatamente todo mundo, as companhias poderiam se tornar insolventes, e os clientes correriam o risco de não ter o reembolso. As novas leis, portanto, olham tanto para o direito dos consumidores quanto para a solvência das empresas.

O advogado especialista em direito do consumidor Vinicius Zwarg, que já foi chefe de gabinete do Procon de São Paulo, concorda que tanto os clientes quanto as empresas são vítimas da pandemia e precisam do amparo da legislação, mas ressalva:

— Existem pontos das novas leis que contrariam frontalmente o Código de Defesa do Consumidor, como o que dispensa o reembolso quando há a remarcação ou a concessão de créditos e o que estabelece que o cancelamento e o adiamento do serviço não ensejam indenização por dano moral. São questões que, com razão, estão desaguando no Poder Judiciário. É certo que o consumidor, para a própria sobrevivência do mercado, pode abrir mão de um pedaço dos seus direitos neste momento de exceção, mas isso não pode ser exagerado.

A insatisfação dos consumidores explodiu durante a pandemia. Um dos melhores termômetros é o portal Consumidor.gov.br, do Ministério da Justiça, que recebe as queixas e favorece a solução dos problemas. No setor de transporte aéreo, entre 2019 e 2020, as reclamações no site subiram de 47,6 mil para 65,5 mil. No setor de viagens e hospedagem, saltaram de 7,7 mil para 40,7 mil.

O baque no setor de turismo em razão da pandemia foi gigantesco. De acordo com um levantamento feito pela Universidade de São Paulo (USP), 45% de todas as demissões ocorridas no Brasil entre janeiro e agosto de 2020 ocorreram no setor de turismo — totalizando 384 mil postos de trabalho formais fechados. Só no setor hoteleiro, 75 mil trabalhadores foram dispensados.

Diz o presidente da Associação Brasileira da Indústria de Hotéis (Abih), Manoel Linhares:

— No ano passado, com as restrições impostas pela pandemia, os hotéis passaram nove meses fechados, sem nenhum faturamento. A consequência foi o encerramento das atividades de diversos meios de hospedagem do país. Nos que se mantiveram abertos, a ocupação média nos últimos meses não chegou a 15%, o que nem sequer cobre os custos de operação. Os prejuízos são incalculáveis.

Na aviação, os números também são eloquentes. Em abril de 2020, logo após a chegada da pandemia, apenas 439 mil passageiros fizeram voos domésticos e internacionais no Brasil. Em abril de 2019, como comparação, houve 9,2 milhões de viajantes. Isso representa uma queda de mais de 95%. Os números são da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac).

A Associação Brasileira das Empresas Aéreas (Abear), que representa as maiores companhias do setor, enumera as dificuldades: “De uma hora para outra, voos cancelados, readequação de malha aérea, falta de previsibilidade, redução do quadro de funcionários. Não foi fácil. As empresas levaram um tempo para se adequar ao novo cenário”.

O setor aéreo espera receber apoio financeiro do poder público, de acordo com a Abear: “Houve o diferimento [adiamento] de tarifas de navegação aérea e tributos federais no ano de 2020 e a edição da medida provisória que permitiu a redução de jornadas e salários. O que se espera em 2021 é a reedição dessas demandas econômicas e a criação de um programa de regularização tributária para os setores fortemente impactados pela pandemia. O que faltou foi a criação de uma linha de crédito para o setor aéreo, que acabou não se viabilizando junto ao BNDES [Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social] e a bancos públicos”.

A demanda do setor hoteleiro é semelhante. O presidente da Abih afirma:

— O setor ainda sofre com restrições, em alguns casos ainda mais severas do que em 2020. Por isso, é necessário que haja uma medida semelhante à MP 944 [de 2020], que garantiu linhas de crédito para pagar os salários dos colaboradores do setor. É preciso que se suspenda a cobrança das parcelas dos fundos de financiamentos também em 2021, como feito em 2020, e se abram novas linhas de crédito acessível para evitar que mais unidades hoteleiras encerrem suas atividades.

Diante da queda acentuada da demanda, diversas empresas do setor de turismo foram além das novas leis e passaram a oferecer a possibilidade de reembolso em dinheiro e sem multas caso o cliente não se sinta seguro para viajar na data marcada e desista do passeio. Pelas leis, em caso de cancelamento, as companhias podem cobrar multas contratuais ou oferecer vouchers com os créditos.

A norma que trata do cancelamento e do adiamento dos serviços de turismo e lazer, como hotéis, cruzeiros e pacotes de viagem, é a Lei 14.046/2020. A que trata das passagens aéreas é a Lei 14.034/2020. De acordo com esta última, as regras para o cancelamento e a remarcação dos bilhetes valem até 31 de outubro deste ano.

No mês passado, o senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP) apresentou um projeto de lei que, se for aprovado, dará mais dois meses de vigência às regras, até 31 de dezembro deste ano (PL 885/2021). A proposta estabelece o mesmo o prazo para que as empresas aéreas utilizem recursos do Fundo Nacional de Aviação Civil (Fnac) como garantia na obtenção de empréstimos para cobrir os prejuízos decorrentes da pandemia.

— A prorrogação é necessária para proteger os direitos dos consumidores, fortalecer as medidas de isolamento social e reduzir o risco de transmissão de novas cepas do vírus pelo país. Entretanto, é preciso também apoiar a aviação civil, que neste ano novamente será um dos setores mais afetados pela pandemia — argumenta Randolfe.

Fonte: Agência Senado

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